domingo, 25 de setembro de 2011

O Conhecimento por Simulação: o Processo de Imaginação Auxiliado por Computador


Jonatan Rafael

            Quando Descartes (2008) em 1637 afirmava que a leitura de ficção era o mesmo que encontrar nobres de outros tempos e que estimulava a imaginação a viagens e experiências improváveis, não poderia ele conceber que quatro séculos mais tarde tudo o que disse seria possível por meio de uma intrincada rede de máquinas com a capacidade de simular um universo em paralelo[1].
            Atualmente, utilizamos o mesmo processo descrito por René Descartes, porém, ao invés de livros, temos em nossas mãos computadores, smartphones e tablets ou qualquer outro equipamento digital que permita a mediação eletrônica entre conteúdo e receptor. Podemos dizer que a aquisição desse conhecimento não acontece de forma teórica ou prática, mas sim por simulação e que é descrito por Lévy (2010) como a “imaginação auxiliada por computador”.
            No período inicial, a simulação do real tinha como objetivo o escape e a libertação e era muito bem estereotipada pelos videogames, porém, com os avanços da informática, os computadores passaram a integrar os maiores elementos para que um "universo em paralelo” fosse criado e vivenciado.
            Aos poucos, com o que Mcluhan (2007) chamou de “revolução elétrica”, os meios digitais de comunicação se popularizaram e foram atualizados. Escolas de todo o mundo adquiriam computadores como elementos de auxílio no processo de aprendizagem e davam noções de manuseio da informática aos seus alunos. No entanto, eles ainda precisavam freqüentar, fisicamente, a escola. Na existia, naquele momento, a incorporação da internet como instrumento, era ainda vista com diversão, recreio para aqueles alunos fatigados do conteúdo programático escolar.
            A partir de então, a memória informacional tomou o lugar da experiência que exigia a execução para que o conhecimento pudesse ser consolidado, visando não somente a qualidade na aprendizagem, mas também a velocidade. Porém, quando falamos em velocidade de informação, percebemos que a fonte transmite as informações modo associativo, ou seja, um assunto leva o receptor a outro e assim por diante, criando um ciclo infindável de ligações (BUSH, 1945).
            Dessa forma, somente o significado é importante, ou seja, o caráter interpretativo é que recebe prioridade, e então entram elementos gráficos, por exemplo, para auxiliar a compreensão do significado de termo ou conceito. O fenômeno é descrito por Pierre Lévy (2010) com o declínio da verdade. Nesse ínterim, propõe que a verdade deixa de ser um axioma e está, também, passível de interpretações, nunca mais sendo absoluta.
            No caso da mediação por computador, as associações não ocorrem apenas de forma escrita, ao contrário, as imagens e outras estratagemas interativas são criadas para que o aluno possa compreender e memorizar o que lhe é ministrado. Logo, o processo de aprendizagem por mediação digital transforma-se em uma excelente alternativa para receptores com afasia, concebendo tipologias gráficas de maior inteligibilidade para esse público em especial.
            Identificamos que os elementos cognitivos deixaram de ser estabelecidos pela dicotomia certo e errado e deram vazão ao campo interpretativo. Correntes lingüísticas defendem que, em determinados contextos, não é possível julgar erros gramaticais e de pronúncia, tornando necessária a análise dos motivos que levaram aos "erros".
           
           

Bubliografia
BUSH, Vannevar. As we may think. 1945. Disponível em: http://www.theatlantic.com/magazine/archive/1945/07/as-we-may-think/3881/. Acesso em 25/09/2011.
DESCARTES, René. Discurso sobre o método. Petrópolis: Vozes, 2008.
LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Rio de Janeiro: Ed. 34, 2010.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensão do homem. São Paulo: Cultrix, 2007.
SJANNON, C. E.. A Mathematical theory of communication.1948. Disponível em http://cm.bell-labs.com/cm/ms/what/shannonday/shannon1948.pdf. Acesso em 25/09/2011.


Leitura complementar
BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo; Loyola, 1999.
JAKOBSON, Roman. Dois aspectos da linguagem e dois tipos de afasia in Linguística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 2010.


[1]É importante diferenciar “universo paralelo” de “universo em paralelo”. Enquanto a primeira acepção refere-se à anulação do universo real, a segunda permite a existência do real e do virtual – e que é o caso do ciberespaço.
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sexta-feira, 23 de setembro de 2011

A Identidade Cultural e as Redes Sociais


Jonatan Rafael

        As redes sociais são muito mais que portais divulgadores de informações ou  aparatos para a conectividade entre usuários através da convergência de interesses e afins. Na verdade, elas ajudam a conceber a identidade cultural de um indivíduo por meio da seleção de conteúdo e a aquisição de novos interesses, usando a co-relação entre diferentes assuntos e novas abordagens.
            Para Stuart Hall (2006, pág. 10) a identidade do homem pós-moderno é a mescla das características do "sujeito do Iluminismo" e o "sujeito sociológico". Enquanto o primeiro tinha no homem o centro de tudo e buscava em si próprio a explicação para o universo que o cercava, o outro passava a criar valores, sentidos e símbolos, abandonando a auto-suficiência então conquistada. Pode-se dizer que, nesse momento, o homem voltou a buscar teorias religiosas que explicassem sua existência – aspecto abandonado durante o período iluminista.
            O “sujeito pós-moderno” está alicerçado na premissa de uma identidade móvel, variável de acordo com as relações estabelecidas por esse indivíduo, sejam elas virtuais ou não. Segundo Hall, dessa maneira é possível adaptar-se a diferentes situações, isto é, usar os preceitos apreendidos nos períodos iluminista e sociológico e moldar-se para uma sociedade globalizada.
            A pluralidade de identidades pode ser explicada através da psicanálise freudiana que aceita a existência do "inconsciente" na mente humana, o que permitiria que informações, desejos e sentimentos se mantivessem aquietados até que fossem despertados em alguma situação específica. Portanto, afirmar que a identidade não é inata permite pensar que sua aquisição acontece com a vivência e com a necessidade de adaptação.
            Obviamente, a aquisição de certos tipos de identidades interferirá diretamente no relacionamento e aceitação do indivíduo com a “consciência pública da sociedade” (DURKHEIM, 2011, pág. 32), ou seja, de acordo com o comportamento, alguns grupos excluíram automaticamente certos candidatos a membros.
            É interessante pensar sobre o que o filósofo alemão Theodor Adorno chama de tempo livre e aplicar esse conceito à sociedade contemporânea. Na concepção de Adorno (2002, pág. 103), todo o tempo que não é preenchido com trabalho pode ser considerado livre. Então, vejamos, quando as redes sociais surgiram eram uma alternativa à tevê, assim, apenas um mecanismo de entretenimento e distração. No entanto, no decorrer de poucos anos desde o surgimento das redes sociais, elas desmancharam esse conceito haja vista seu intenso uso para promover organizações ou, ainda, no intento de angariar contato tanto para a vida profissional quanto privada.
            Assim, como o tempo livre, as redes sociais proporcionam a sensação de liberdade e desprendimento de algo nocivo (trabalho, escola, família e tantos outros “instrumentos coercivos). A fascinação que o ser humano tem sobre si - e vendo a si próprio refletido no outro - explica um pouco do poder exercido pelas facilidade de conectar a pessoas do mundo inteiro, compartilhar opiniões e descobrir novos eus, antes escondido por concepções ou adquiridas segundo a educação formal, preceitos familiares ou religiosos. Essa é, sem dúvida, uma maneira de revisitarmos o mito grego de Narciso, rapaz que se apaixona por reflexo na água, porém, muito mais que nosso reflexo, as redes sociais se transformaram no que Marshall Mcluhan (2007) chama de “extensões do homem" .
            Podemos, portanto, afirmar que o indivíduo busca no outro, não somente a afirmação social, mas também uma identificação que lhe caiba e com a qual poderá circular nos grupos que freqüenta de forma livre, sendo visto em dois âmbitos distintos, entretanto, complementares: o individual e o coletivo. Então, no momento que essas comunidades sociais virtuais são formadas, elas, imediatamente, se transformam em grupos imaginários, pois a visão de cada membro a cerca deste depende, basicamente, de suas opiniões e valores sobre o fator de união daquele grupo. Assim, cada membro  cria em si uma imagem e um ethos para a comunidade virtual da qual participa.
            No primeiro caso, esse ator social pretende ser visto isoladamente, tendo características próprias, que o diferenciem dos demais. No outro caso, ele pretende usar suas peculiaridades para ingressar em um grupo social, fazendo com os demais membros o aceitem graças à ideologia, opinião, modo de vestir, música preferida, filmes que gosta e etc.
            Como o que foi explicado por Hall, a pluralidade de identidades e identificações permite que qualquer pessoa transite por quantos grupos sociais desejar, adequando-se momentaneamente a cada um deles. Um exemplo válido são as comunidades no Orkut. Um mesmo usuário desse site pode participar de quantas comunidades desejar, mesmo que o ingresso em um possa parecer, ideologicamente, contraditório à sua participação em outra. Não existem conflitos diretos, no âmbito ideológico, pois, como foi dito anteriormente, a rede social passa a impressão de liberdade, algo que não, totalmente, verídico, principalmente do ponto de vista jurídico.


Bibliografia
ADORNO, Theodor. O Tempo Livre in Indústria Cultural e Sociedade. São Paulo: Paz e Terra, 2002
DURKHEIM, Émile. As Regras do Método Sociológico. São Paulo: Martin Claret, 2011
HALL, Stuart. Identidade Cultural na Pós-modernidade.Rio de Janeiro: DP&A, 2006
 MCLUHAN, Marshall. Os Meios de Comunicação como Extensões do Homem. São Paulo: Cultrix, 2007